quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

"Santo Tomás de Aquino: a Cidade em Ordem a Cristo"


Carlos Nougué




Apresento abaixo o Proêmio do anunciado livro Santo Tomás: a Cidade em Ordem a Cristo (título definitivo). Pretendo escrevê-lo de modo que possa publicar algo ao menos quinzenalmente. Mas isto dependerá sempre de condições concretas.




Santo Tomás de Aquino:


a cidade em ordem a Cristo





Proêmio



Objeto deste livro



Como diria Aristóteles, não encontramos ao termo de uma investigação senão aquilo que já procurávamos o que é natural, se se considera que toda e qualquer conclusão já está implícita no conjunto de suas premissas.


Se assim é, o objeto deste livro é duplo:


a) mostrar que a conclusão de Santo Tomás segundo a qual a cidade ou pólis não pode ter por fim último senão a Deus decorre perfeitamente de determinadas premissas;


b) que essas premissas, de fato, ou se provam racionalmente ou se fundam na autoridade da Revelação e do magistério infalível da Igreja, com o que fica provada ou fundada, igualmente, aquela conclusão.


Que premissas são estas? Apresentemo-las em dois polissilogismos:


• Não pode haver mais que um fim último.


Ora, Deus é o fim último de todo o universo – e pois do homem, que se ordena a Ele segundo sua natureza própria de animal racional, social e histórico.[1][1]


• Sucede que, por essa mesma sociabilidade natural, as multidões humanas se reúnem em cidades, e o fim próximo das cidades humanas é a vida virtuosa.


• Se porém não há mais que um único fim último e se este é Deus, todo e qualquer outro fim – incluído o das cidades – não pode senão ordenar-se essencialmente, como fim intermediário ou meio, ao Fim dos fins.


• Ademais, o fim último de uma multidão não pode ser distinto do fim último de cada indivíduo que a compõe.


Logo, tanto a vida virtuosa como aquilo que a tem por fim próximo – ou seja, a mesma cidade ou pólis – se ordenam essencialmente a Deus.


Há mais, porém.


Para que um fim possa ordenar-se como meio ao fim último, é preciso um agente superior capaz precisamente de utilizar-se, como de um instrumento, daquilo que tem tal fim intermediário.


Se assim é, o estado, que é o poder civil sob o qual se põe a cidade organizada em regime político, deve ser utilizado como instrumento por um agente que lhe seja superior, para que o fim próximo dela, a vida virtuosa, se ordene como meio ao fim último.


Mas, como se trata de Deus enquanto fim último, tal agente superior há de ser propriamente competente para conduzir a Ele.


Ora, dada a história humana – que vai do Éden e da queda original ao fim dos tempos, passando pela Redenção –, o único agente competente para conduzir a Deus é a Igreja, instituída precisamente para isso.


Sucede ademais que, dada justamente a Redenção propiciada pela Paixão e Morte de Cristo – sem a qual não poderia o homem reconciliar-se com Deus –, a ordenação de todo o humano a Ele assumiu a forma concreta de ordenação a Nosso Senhor Jesus Cristo e a Seu Reino assim na terra como no céu.[2][2]


Logo, o estado – enquanto poder civil sob o qual se põe a cidade organizada em regime político – deve ser usado como instrumento pela Igreja em ordem a Cristo (assim como, analogamente, como se verá, o corpo se ordena como instrumento à alma no composto humano; a natureza à graça no justo; e a razão à fé na sacra teologia).[3][3]


§ Donde a conclusão geral: a cidade não pode ordenar-se ultimamente senão a Cristo Rei.


Trata-se neste livro, portanto – insista-se –, de provar segundo a razão ou de confirmar segundo a fé as premissas desta conclusão geral. Provadas ou confirmadas aquelas,[4][4] obviamente estará firmada esta.


(continue lendo)